Quem nunca jogou Botão atire a primeira pedra


Aos 09 anos de idade, minha grande fascinação era jogar futebol de botão. Jogava todo dia, toda hora, em campeonatos com várias pessoas,duelos que duravam a tarde contra um adversário ou jogava sozinho no chão da sala.

Meu primeiro time de botão era de plástico, o goleiro era pequeno deixava sempre o ângulo aberto para os gols colocados (Prepara…Pega! Goooooolaço!!!) a trave de plástico,feia de doer, mas a gente dizia que era “estilo” do Maracanã.

Depois de jogar muito em vários ambientes (chão da sala, terraço, em cima da mesa de jantar) ganhei meu campinho de madeira da Xalingo, o danado era feio, não tinha nada, apenas a madeira por cima e o compensado embaixo, não marcava placar, e a marca do pênalti era tão próxima que não dava para fazer gol.

Naquele aniversário ganhei mais 03 times de plástico – Flamengo, Santos e Vasco – os dois últimos foram presentes do meu avô, o primeiro, deveria ter sido do Campinense, porém a fábrica desses times de plástico não tinha lançado botões regionais, poderiam ser do Sport, caso a fábrica não fosse tão concentrada em criar a idéia de que só exitia futebol no Rio e em SP.

Esses times de plástico do começo dos anos de 1980 eram do pior tipo de plástico, vira e mexe, um botão quebrava em uma colisão, a palheta não durava 05 dias, o escudo do time descolava e lá ida o jogador sem a “camisa” depois de um belo passe para o ataque.

Em um dia, talvez um dos primeiros mais felizes em Recife, meu avô retornou de uma viagem para São Paulo – como era longe – e trouxe dois times de acrílico, Santos e São Paulo, o primeiro ainda uma insistência para que eu virasse torcedor do melhor time que ele tinha visto jogar, era o time de Pelé, dos craques da Copa do México de 1970. O segundo era o time do momento, os meninos de Cilinho, o jogo fácil, corrido, festejado como modelo para uma seleção brasileira – a ironia é que o Professor Telê iria tornar esse time mais bonito ainda e vencedor anos mais tarde.

Esses times de acrílico eram mais resistentes, não vinham em saco plástico como os outros, estavam devidamente guardados em uma caixinha bonita, também de acrílico, os goleiros já não eram apenas peças pequenas e de uma cor apenas, vinha o goleiro azul, vermelho e ainda o preto, a barrinha para mover o goleiro não era mais um pedaço de plástico qualquer, tinha uma elegância,as traves, agora no “estilo” Morumbi, eram quadradas, com desenho detalhado da rede, eram lindas, davam uma austeridade ao campinho da Xalingo que rapidamente passou por uma reforma, coloquei placas de publicidade, placar no canto, e agora para o desespero dos meus adversários, era encerado quase todo o dia – não sei onde aprendi isso – jogar no meu campo não era para qualquer um, a habilidade em segurar um botão que corria desesperadamente levava tempo, o tempo da goleada começar.

Naquele ano de 1986 os times do Santos e do São Paulo, foram transformados em Brasil e Itália, o São Paulo tinha um goleiro azul (virou goleiro da Itália) e o Santos tinha os jogadores transparentes, virou o time do Brasil, porque ficava mais interessante o visual.

Aprendi naquele ano, que o Brasil em 1978 na Copa da Argentina foi roubado, em face de um jogo comparado entre Argentina x Peru (éramos campeões morais), na Copa da Espanha de 1982 não ganhamos, mas éramos melhores, ganhamos da Argentina, com um tal de Maradona jogando (campeões do futebol arte), agora o time estava experiente e tinha Careca, Zico, Sócrates, Júnior e outros, isso fazia com que acreditasse muito em 1986, afinal de contas, era minha primeira Copa.

O Brasil seria Tetra, Araquém não poderia errar, a escola toda não iria errar, os familiares não poderiam errar, nos primeiros jogos era só festa.

Lembro nitidamente de Josimar fazendo um gol fantástico pela lateral direita, virou logo também meu lateral direito no time de botão, peguei a foto em algum jornal ou revista, não lembro ao certo, colei Josimar, Falcão e Carlos no gol – como era feio o tal do Carlos, acho que tive pesadelos com ele – durante a Copa virei um dirigente profissional do mundo do jogadores de botão, negociei times de plástico por jogadores de botão “verdadeiros”, não era mais o botão de fábrica, era o jogador negociado na Av. Conde da Boavista, uma banca de revista, que só iam profissionais do mundo novo – os botões profissionais.

Aprendi a fabricar goleiros, caixinha de fósforo,cimento e moedinhas, negociava no colégio por dinheiro ou por outros jogadores, troquei a trave do campinho, já não era de plástico, agora, era de madeira e o filó, a bolinha não era mais de pláticos, era de mica e a palheta de semi-profissional, a profissional era muito cara.

Após cada jogo da copa, reproduzia as partidas no campinho (todos os jogos em uma tabela que tinha ida e volta), comprei uma flanela, na qual guardava com carinho os novos jogadores, era questão de tempo apenas para o Brasil ser campeão do Mundo, lembro que falavam da Dinamáquina, da Fúria Espanhola e a constante Alemanha, não ouvia nada sobre a Argentina, o se ouvi algo nesse momento não foi assimilado.

No jogo do Brasil x França (quartas de final), não lembro porque, mas não houve saída para casa de amigos, fiquei em casa com minha avó, assisti o jogo em um TV pequena,branca,com uma alça, tinha sintonizador e antes do jogo minha avó assistia ao Silvio Santos tranquilamente, eu nervoso, vestido de Brasil.

Diziam que o duelo Platini e Zico seria o encontro dos maiores camisas 10 da Copa, final antecipada.O Brasil perdeu nas penalidades máxima, Dr. Sócrates perdeu, bola que bate na trave e volta nas costas do goleiro Carlos.

Chorei muito naquele final de tarde, minha primeira decepção futebolística, sozinho no quarto e com meus pensamentos: queria ter visto a Copa de 1970, conhecer o Santos de Pelé na ativa. Enquanto lambia as feridas, vi o jogo Argentina x Inglatera (quartas de final) entendi quem era o tal Maradona, e que ele era o melhor camisa 10 daquela Copa, aquele era a final antecipada – Malvinas – aprendi a gostar mais de futebol, nesse período li as primeiras colunas de Armando Nogueira, aprendi a entender de futebol, achar em todo lugar literatura e duvidar de tudo que era óbvio.

Durante a Copa… Continua

Fonte:  Aos/as Examinadores/as